Viajar de comboio

Entre os vários tipos de viajantes vamos encontrando sempre preferências quanto ao estilo de "locomoção". Uns adoram o avião, outros são os amantes de road trips e não dispensam o carro para um passeio, outros são fãs de cruzeiros e, há ainda, quem dentro ou fora do conceito de inter-rail prefira viajar de comboio.
Eu prefiro, regra geral, o avião, mas de há algum tempo para cá tenho me dedicado à pesquisa sobre possibilidades de viagens de comboio.

Aqui por terras lusas, a CP não tem andado nos seus piores dias no que toca a promoções e preços especiais. No caso dos comboios alfa pendulares e intercidades há opções de desconto de 40% em compras antecipadas on line (mínimo 5 dias antes da data da viagem em questão), o que torna em muitos casos a viagem mais em conta e ecologicamente mais sustentável para uma, duas ou três pessoas, comprando ao carro por exemplo. Existem, também, outras vantagens como não ter preocupações onde estacionar e ter de arcar com esse custo, portagens, cansaço ao volante, desgaste do veículo, etc. É só entrar, sentar e desfrutar do passeio, sem preocupações. Depois de chegar ao destino é que vem a parte mais chata que é carregar com a mala até ao alojamento escolhido, o que pode não ser tarefa muito penosa seguindo as regras deste artigo.
Aproveitando que não vivo longe de uma paragem de comboios onde param os comboios intercidades, já encontrei oportunidade para fazer algumas escapadinhas por via ferroviária, como por exemplo ao Porto e a Guimarães e, confesso que é um tipo de experiência que gosto e espero vir a fazer muitas mais aproveitando esta vantagem do transporte ferroviário.

Fora do país outra experiência que muito me agradou foi conhecer a Bélgica de comboio. Foram 5 noites em 5 cidades diferentes e todos os percursos entre cidades foram feitos de comboio. A Bélgica é um país muito bem servido de transportes e o ferroviário não é exceção. Existe até um cartão especial de transporte coletivo - Rail Pass - que permite poupar uns trocos e fazer 10 viagens de comboio, independentemente da origem e do destino (se incluir o aeroporto terá de pagar uma taxa extra de 5€ por pessoa para esse trajeto), custando o cartão 76€ na totalidade. Também existem tarifas especiais de fim de semana que são de aproveitar e fizemos isso mesmo no percurso Namur - Dinant - Namur. É uma questão de pesquisar um pouco e encontram-se várias estratégias de poupança para desfrutar das viagens de comboio na Bélgica. Além disso, algumas das estações de comboio na Bélgica são muito mais do que estações. São monumentos, locais que respiram História e é impossível ser indiferente a locais como estes.
Rail Pass
Exemplo de comboios típicos na Valónia


Fotos tiradas durante o percurso de comboio entre Dinant e Namur, com vista para o rio Mosa


Estação de Gante


Estação de Bruges

Estação de Antérpia




Em Itália, o comboio também é um dos meios de transporte mais utilizado para viajar pelo país fora. O grande senão é estarem constantemente atrasados, o que acaba com a paciência de qualquer viajante. Mal começamos a ouvir os avisos sobre ritardos lá nos consumimos mais um pouco. Confesso que nas primeiras viagens a Itália, talvez por ter utilizado os comboios pontualmente, não notei essa situação. Mas no Verão entre Florença, Pisa, La Spezia e as Cinque Terre quase precisei de um retiro espiritual no Tibete para lidar com tantos atrasos. O transporte ferroviário é altamente concorrido e em alguns casos, pode ser boa ideia comprar os bilhetes on line, dado que as tarifas conseguem ser mais baratas do que compradas no balcão ou nas máquinas e ainda se poupa tempo de fila. Comprei bilhetes on line três semanas antes da viagem e o sistema atribuiu-me um bilhete em 1ª classe num comboio frecciabianca (alta velocidade) mais barato que um de 2ª classe num comboio mais lento, não porque eu tenha escolhido, mas simplesmente porque era o mais barato disponível on line. No geral, os bilhetes têm um custo aceitável, já o funcionamento tem de melhorar seriamente. 
O caso mais inaceitável que encontrei foi o das Cinque Terre. O bilhete para viajar entre as cinco localidades livremente durante um dia inteiro, sendo que da primeira à última vão 11km, custa 12€ o que já é caro por si só. O pior é que na maioria dos horários, mesmo em época alta, só há um comboio por hora e isto com as estações a rebentar de gente. Não dá para perceber para onde vai o dinheiro dos bilhetes, ou até dá, mas não é para investir na rede ferroviária. Chegámos a ver automotoras ainda a funcionar nalguns trajetos. Isto parece impossível na Europa central. 
Estação de Monterosso

Mais um ritardo - Estação de La Spezia
A caminho de Como
Em Marrocos, a experiência é bem mais comum do que se possa pensar. Utilizei o comboio na linha de aeroporto em Casablanca até a centro da cidade e de Casablanca para ir à capital Rabat. A linha de aeroporto utiliza comboios bastante antigos e pouco adequada aos próprios viajantes locais que levam o mundo dentro da carruagem. Contudo entre Casablanca e Rabat o que verificamos é um serviço suburbano idêntico ao nosso, até pelo tipo de comboio, velocidade, etc. Os preços não são muito baratos para carteiras marroquinas, mas para as nossas são aceitáveis.
Viagem Casablanca - Rabat

Gare de Marraquexe
Contudo, a derradeira experiência de velocidade consequência da alta tecnologia deu-se na China. Quando eu e o meu marido estivemos em lua de mel no país fizemos vários trajetos de comboio. Começámos logo no aeroporto de Xangai, onde deixámos o metro para outras ocasiões e demos prioridade ao Maglev, o comboio de levitação magnética que em efémeros 8 minutos nos transportou por 30 km e nos levou ao centro da cidade.


Maglev na linha que liga o aeroporto internacional de Pudong ao centro de Xangai

 Nos restantes trajetos privilegiámos sempre os comboios G, que são os mais rápidos, sempre que esses existiam para os trajetos em questão, isto porque os chamados bullet train não funcionam em toda a rede ferroviária do país. Chegámos a usar o comboio K que demorou quase seis horas a fazer menos de 400km. O Comboio G (também pode estar identificado com as letras C e D) é o bullet train, com o tal o mais rápido. Há uma série de letras que designam os vários tipos de comboio. Os Z circulam normalmente a 160km/h, os T a 140km/h, os K a 120km/h. Há mais uns quantos tipos, mas estes são os mais usados pelos turistas que andam a conhecer o país. 
Não se pense que é fácil como no ocidente apanhar um comboio na China. As rotas são muito concorridas e só apenas umas semanas antes os bilhetes ficam à venda on-line através de agências. O primeiro passo é fazer a reserva do bilhete, mas mesmo assim não é garantido que se obtenha o tipo de comboio e classe de lugar pretendidos. O melhor é fazer com tanta antecedência quanto possível para tentar garantir a primeira opção em mente. No caso de não ser possível reservar o pretendido o dinheiro do pagamento é devolvido ou pode-se optar por uma segunda opção e faz-se o acerto do valor. 
Comprovativo de compra do bilhete para poder levantá-lo na estação de partida
O segundo passo é imprimir o comprovativo de reserva que é enviado logo que esteja confirmada a disponibilidade dos critérios solicitados e levar esse papel ao balcão da estação de comboio de partida juntamente com o seu passaporte. Contudo, não se pense que se entra assim sem mais nem menos numa bilheteira ou na porta principal da estação. Vai ter de passar o controlo de segurança (do género daqueles do aeroporto) e isto é válido também para o metro e para muitas outras circunstâncias na China. No balcão da bilheteira se levar o comprovativo como o abaixo indicado, qualquer "janelinha" serve para o atender porque as instruções estão em chinês para que o/a funcionário/a possa imprimir o bilhete. Contudo se não tiver a compra feita on line como foi o nosso caso para os trajetos entre Xangai e Datong (há casos em que não se justifica, como por exemplo em distâncias curtas com comboios frequentes, dado que a compra on-line tem uma taxa extra por bilhete) vai ter de procurar a "janelinha" onde haja um funcionário a falar inglês e isso pode não estar identificado como verificámos. Chegámos a estar quase meia hora numa fila e depois fazerem-nos um gesto para ir para outra e tive de escrever um G numa folha para o funcionário perceber o tipo de comboio que eu queria, pois ele já estava a emitir bilhetes num tipo de comboio que demoraria uma eternidade numa distância que pode ser feita em pouco mais de meia hora. 
Cábula para fazer leitura mínima do bilhete de comboio
Bilhete de bullet train (G) Suzhou - Xangai HongQiao
Bilhete de comboio (K) Pequim - Datong 
Bilhete de Bullet train (G) Xangai - Suzhou

O terceiro passo é apresentar-se com bastante antecedência na estação para embarcar, dado que vai ter de passar na segurança e vai ter de aguardar numa sala de espera, que é diferente para cada código de comboio.
Uma sala de espera na estação de Suzhou

Por fim, um dos funcionários da estação dará início ao embarque e controlará a leitura dos bilhetes. Eu penso que isto decorrerá assim não só por paranóia e por questões ligadas ao regime, mas também porque os chineses são muitos e culturalmente desordenados. Se as plataformas estivessem abertas livremente para que todos pudessem aceder, provavelmente era o caos e ainda se matavam uns aos outros aos empurrões para a linha quando o comboio se estivesse a aproximar.
Bullet train em Suzhou

Bullet train no trajeto Xangai - Pequim


Como podem perceber, na China usar o comboio não é muito diferente de usar o avião, com tantos procedimentos antes do embarque. Mas o melhor é a experiência da velocidade, que nem se sente em termos de trepidação. Sair às 8h da manhã de Xangai e chegar às 13h a Pequim é uma experiência única e da qual todos os que gostam de andar de comboio deviam desfrutar.




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